quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Sobre as Estrelas...


Uma breve passagem do meu livro, para apreciação geral.



...
Do lado de fora, encontravam-se apenas Sidarta e Silvia. Os dois estavam deitados, olhando para o céu. Apenas um tapete cozido a partir de talos de gramíneas os separavam do chão. A orelha direita do maculado encostada a mesma orelha da garota. Juntos, admiravam o firmamento, perfeitamente iluminado.
- Sempre fui fascinado pelas estrelas! – comentou o rapaz.
- São lindas mesmo! Fico me perguntando, como seria viver entre elas? Deve ser um lugar lindo, pacífico.
- Aí é que você se engana! Essa aparência bela que nós observamos daqui é apenas uma ilusão.
- Como assim?
- As estrelas são enormes fornos nucleares, com temperaturas altíssimas. Algumas, às vezes, explodem, destruindo tudo que há pelo horizonte, derramando radiação e destroços por todo espaço.
- Nossa, que horrível! Como você pode admirar uma coisa dessas? Meus antepassados imaginavam o céu como uma enorme pele que cobria o firmamento. Nessa pele estavam grudados os espíritos luminosos que nos guiam à noite, quando o grande sol morre no oeste. Aí elas velam por nós até que o astro luminoso vence a morte e renasce no leste. Às vezes algumas se lançam do céu e vem para pertinho da gente. Eles também me contavam que a posição delas poderia nos dizer coisas quanto a nossa sorte, sabe? Coisas do futuro!
- Bem, eu não acredito nisso! Meu pai foi – o jovem hesitou por um instante, engolindo uma agonia que lhe acrescia pela garganta - é um homem muito inteligente – continuou – e nós passávamos as noites assim, como estamos agora. Era quando ele me ensinava as coisas da natureza. E sempre que ele falava das estrelas, eu me emocionava.
- Mas pelo que você disse, elas são terríveis!
- Não da maneira como eu as vejo. Meu pai me explicou que vivemos num universo muito grande, muito grande mesmo, tão grande que a luz, que é a coisa mais rápida que existe, levaria bilhões de anos para atravessá-lo de uma ponta a outra.
- Nossa! Então é maior que esse deserto?
- Caberiam bilhões, trilhões, infinitos desertos como esse no universo.
- E como foi que ele surgiu?
- Dizem que começou quando tudo que tem hoje no mundo cabia num pontinho. Aí ele explodiu e expandiu.
- E antes disso? O que havia antes disso?
- Não sei!
- E você ainda não me explicou como uma coisa mortífera pode ser bela!
- A beleza disso depende da maneira como você as vê. Olha, antes no universo só havia gás. Enormes bolas de gás que se juntaram e formaram as estrelas, essas que ficam piscando à noite – Sidarta ergueu a mão e apontou para algumas. – Cada estrela pode viver por muitos anos e, enquanto elas vivem, vão formando os outros elementos da natureza. Aí um belo dia o gás acaba e ela vira um supernova. Ela incha, fica bem grande e explode, sobrando apenas um buraco negro no lugar.
- Lá vem você de novo com as explosões! – falou soltando um leve sorriso e cutucando o ombro do maculado.
- Aí que começa o fascínio! Ela explode e jogo detritos por todo o espaço, o que chamavam de poeira estelar. Essa poeira se junta de novo, formando novos corpos celestes e novas substâncias, como a água, o oxigênio, a areia, dentre outras coisas. Esses corpos celestes não tem luz própria, por isso eles apenas refletem a luz das estrelas.
- Esses seriam os planetas?
- Isso mesmo! Veja ali um deles – apontando novamente para o céu. – Aquele é Marte, o quarto planeta do sistema solar. Todo feito de rocha, infelizmente desabitado. Quando ocorreu o holocausto, estávamos prestes a mandar as primeiras expedições tripuladas para lá. Uma pena! Olhe outro ali! Aquele é Júpiter, o maior planeta do sistema. É uma gigantesca bola de gás. Ali tem mais outro. Acho que é Saturno. Esse eu acho o mais belo!
- Por que? Tem muita destruição por lá também?
- Engraçadinha! Este é o planeta dos anéis. É o segundo maior, também feito em sua maioria por gases e rodeado por um belíssimo anel feito de poeira que não se agregou ao planeta!
- Como você pode dizer que é belo se nunca o viu?
- Mas eu imagino!
- E onde você aprendeu sobre esses anéis mágicos do tamanho de um planeta?
- Eu lhe disse, meu pai!
- Você sente muita falta dele?
Os olhos de Sidarta marejaram. O silêncio do maculado serviu como resposta. Silvia então tentou voltar ao assunto.
- Além desses anéis, o que mais tem de belo nesse seu universo?
- A mesma poeira estelar que deu origem aos anéis de Saturno também estão presentes aqui na Terra. Somos resquícios das estrelas. Os átomos que formam meu corpo, minhas mãos, pés, olhos, lábios podem ter sido originados de explosões diferentes daquelas que formaram os átomos que hoje estão presentes em você...
- Mãos, pés, olhos, lábios – repetiu a garota.
- Isso mesmo – assentiu com um tímido sorriso. – Estrelas longínquas bilhões de anos atrás que posso unir com um simples gesto – mirava fixamente o rosto de Silvia. Com um impulso delicado, sorveu a umidade dos lábios da garota, apreciando com deleite a maciez e o gosto daquele sabor inédito, quente, delicioso. Seu coração disparava num ritmo novo. Afastou-se comedido, abrindo os olhos e se deparando com um sorriso tímido, mas de desfrute. Encabulado, também sorriu.
- Isso sim é lindo!
- Como eu estava...
- Shhh! – interrompeu Silvia. – Não estrague o momento com mais ciência!
...


(PROMETEU, BR Rosado, capítulo XI - A Dança de Shiva)

Nenhum comentário:

Postar um comentário